terça-feira, 24 de janeiro de 2012

A TELA NOSTÁLGICA

Com o anúncio hoje das indicações ao oscar 2012, está oficialmente aberta a temporada de caça à famosa estatueta dourada. Dois filmes se destacam entre os indicados: A invenção de Hugo Cabret, filme voltado para o público infantil, do genial mestre Martin Scorsese; e a produção franco-belga O artista, de Michael Hazanavicius. O primeiro recebeu 11 indicações, enquanto o segundo 10.

Essas duas produções se remetem aos primórdios do cinema, fazendo homenagens aos pioneiros do cinema mudo. Na era do 3D, a sétima arte se volta para as suas origens pré-revolução sonora e nos convida a embarcar nessa aventura nostálgica.


O filme de Scorsese é baseado num best-seller infantil escrito por Brian Selznick (escritor descendente do visionário produtor de ...E o vento levou, David O. Selznick) e foi um pedido de sua filha Francesca Scorsese, que, após ler o livro, o intimou para que fizesse o filme para ela. O velho Martin não podia ter dado um presente melhor a sua filha, A invenção de Hugo Cabret é um filme belíssimo, tecnicamente perfeito, extremamente envolvente que, em cima de uma trama leve de aventura, presta uma homenagem à invenção do cinema e à figura e obra de Georges Méliès. Tudo no filme é lindo, mas vale destaque a reconstituição dos estúdios de Méliès e a encenação da primeira sessão de cinema realizada pelos irmãos Lumiére na Paris de 1895.

Já o filme de Hazanavicius pode entrar para a história do cinema, sendo o primeiro filme de produção estrangeira (não-americana ou britânica) a levar o oscar de melhor filme; o primeiro em p&b, desde A lista de Schindler, e o primeiro mudo, desde Asas, que venceu o troféu em 1929, na primeira edição do prêmio. E tudo indica que O artista fará mesmo história! Essa ousada produção (é fora do comum a produção de um filme mudo e em preto-e-branco nos dias de hoje) traça uma trama bela e humana sobre a Hollywood da passagem dos anos 20 aos 30 do século passado, onde o advento dos filmes sonoros revolucionou a produção cinematográfica mundial. Com influências nítidas de Cantando na chuva (1952) e Nasce uma estrela (1937), O artista revela ao mundo, também, o talento do ator francês Jean Dujardin, que já foi premiado no Festival de Cannes e merece o oscar por seu desempenho como o astro decadente George Valentin, protagonista da trama. Dujardin está a cara do saudoso Fredric March, protagonista de Nasce uma estrela.



Dois filmes que merecem ser conferidos e que cumprem muito bem o papel de nos guiar nessa deliciosa nostalgia dos tempos iniciais da sétima arte, da sensação de descoberta de um novo mundo de sonhos que se apresenta na tela do cinema, e que é capaz de tocar o mais duro dos corações. É o poder transformador do cinema, mesmo em p&b e sem som.

segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

O COMPLEXO DE MINERVA

O COMPLEXO DE MINERVA

Ms. Alberon Lemos[1]

            No meio acadêmico é extremamente comum os docentes se depararem com afirmações do alunado expondo suas eventuais deficiências como barreiras intransponíveis; falas como “eu não consigo entender este texto” ou “não sei colocar minhas ideias no papel”, demonstram não só uma dificuldade de leitura e escrita por parte dos discentes, mas também uma postura assaz corriqueira e preocupante por parte do alunado em encarar o processo de aprendizagem e desenvolvimento intelectual como características imediatas.
            Costumo caracterizar esta postura de não estar atento para o percurso do desenvolvimento intelectual de “Complexo de Minerva”. Na mitologia romana, Minerva (Atena para os gregos) era a deusa da sabedoria, filha exclusivamente de Júpiter (Zeus) e que nascera já adulta e com indumentária de guerra, emergindo de uma fenda na coxa de seu pai.
            Muitos alunos se comportam como se fossem Minervas ou anti-Minervas; que ou dominam o ato da escrita, da crítica, da leitura ou que são incapazes de desenvolverem essas aptidões, encarando o ato de aprender não como um processo, mas como um dom. Nenhum intelectual nasceu pronto do ventre de sua genitora, nenhuma teoria ou conceito surgiram por lances de mágica. Todo conhecimento é fruto de um processo de construção onde não só êxitos são presentes; as derrotas, frustrações e erros também são etapas necessárias na produção do saber.
            Sendo assim, devemos nos libertar de qualquer aura de auto-suficiência, de pudores e de medos e – mesmo sem estarmos vestidos com a armadura de Minerva – nos entregar à aventura da construção do saber; encarando-a como uma jornada onde cada vitória deve ser comemorada e as falhas avaliadas de modo a proporcionarem estímulos.
            Então, vamos à luta todos com a consciência de nossa condição de aprendizes; essa consciência é um pressuposto indispensável à construção do saber e à transformação da nossa realidade pessoal e social.


[1] Mestre e doutorando em História pela UFPE e professor da UPE – Campus Mata Norte.